O FANÁTICO [FILME] (2019):

Sombrionauta
4 min readSep 30, 2020

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Quando vemos um filme com uma boa premissa e uma má execução dar uma menção honrosa é necessário.

Aqui temos esse filme cujo diretor foi Fred Durst (Limp Biskit), que além disso escreveu também o roteiro junto com Dave Beckman: a premissa é bem comum e sempre interessante em se mostrar como é o pensamento dos fãs da cultura pop.

PORÉM, TAL QUAL O LIMP BISKIT VEMOS QUE DURST CARECE NÃO DE CRIATIVIDADE, MAS SIM DE HABILIDADE PARA DAR PROSSEGUIMENTO A SUA IDÉIA.

Somos apresentados ao decadente Moose (John Travolta, ainda mais decadente, mas sem ter controle disso como o Marylyn Manson) fã de filmes de ação, em especial dos feitos por Hunter Dunbar (Devon Sawa).

Por meio de seu fanatismo somos apresentados a psicologia dos fãs. Tudo vai bem por mais ou menos 15 minutos.

DEPOIS NADA DÁ MAIS CERTO.

Entrecortado, como se fossem atos (coisa que demarca que você ou é um gênio, ou, está escrevendo usando um manual de roteiro ou um programa que cumpre essa função) demarcado por desenhos de Durst (gosto do traço grafite dele) que parecem uma espécie de storyboard.

A meu ver, Durst tinha na verdade desenhado Storyboard mas não sabia exatamente como organizar falas e narrativa neles e Beckman não ajudou muito nesse quesito também. Parece certo tipo de rap que tem boas frases que não se encaixam, tipo o que o pessoal chamava de rap “chuva com uva”, onde as rimas são divertidas, mas não conseguem compor um grande sentido final de conjunto por si só. O Sabotagem (1973–2003) escrevia assim tanto quanto o grosso da nova escola do rap (brasileiro ou não).

É uma marca do tipo de artista que ele é: habilidoso, mas pouco educado (seja por meios escolares ou por autodidatismo: “educado” assim significa aqui ter acesso ao material para se tornar mais sofisticado em sua arte). Sua própria banda demarca isso. Um vocalista criativo, mas pouco habilidoso, confiando em seus instintos e que se cerca de gente com treinamento técnico adequado, mas que não conseguem dialogar muito bem.

ALIÁS, SE PENSARMOS BEM, TODAS AS BANDAS DO MAX CAVALERA SÃO ASSIM, PORÉM ELE É MAIS HABILIDOSO (TECNICAMENTE) QUE O DURST.

Com o decadente Moose temos mais uma confissão do Durst do que uma narrativa: ele mesmo disse que se baseou em eventos que aconteceram com ele.

Aqui faltou a coragem a Durst que a técnica confere: A DE SE EXPOR COM SEGURANÇA.

Pois Moose poderia ter sido um ótimo personagem, mas é vítima de três astros que não sabem mais respeitar seu público: Dunbar, Durst e Travolta.

Aparece no decorrer do filme um desprezo pelo fã, de como ele se projeta em seus ídolos, de como ele se anula em favor daquilo que gosta (coisa que cobramos do artista).

Sem problema nesse sentido, pois isso faz sentido: fãs fazem isso mesmo. Temos uma fasta filmografia sobre esse assunto, e cá entre nós acho que até mesmo O HOMEM QUE RI (1928) pode ter sido um dos primeiros a abordar como fãs querem governar arte de acordo com seus anseios e não pela vontade dos artistas (trabalhadores, não esqueça).

O problema é a interpretação de Travolta: ele faz um Moose que transparece tantos preconceitos sobre os fãs e sobre as pessoas com deficiências mentais que ficamos nos perguntando se ele quer descarregar, assim como Durst, todas as humilhações que ambos passaram por serem astros agora em franco esquecimento.

Travolta disse que adorou a liberdade do papel, e acho que ele quer dizer que adorou finalmente expressar o que sentia em relação ao público.

Mas como li algum tempo atrás, teatro é habilidade do ator e cinema é competência do diretor.

O diretor-vocalista Durst deu uma entrevista recentemente dizendo que não tinha amigos no Limp Biskit e que estavam juntos pelo prazer de tocar, por serem o tipo de banda que queriam ouvir quando eram fãs. Em algum momento esse tipo auto estima se tornou desprezo por si projetado. Isso foi fundamental para a arte na década de 90, mas hoje já superamos isso.

Sendo assim, se o filme fosse abertamente um realismo fantástico, talvez com cenas de Durst conversando com Travolta sobre o que se espera de um fã, teríamos um grande filme de como os artistas veem seu público.

Contudo Durst não consegue. Lhe falta habilidade para isso. Arrogância ele tem.

A sentença acima seria um ótimo epitáfio para o New Metal e toda a arte dos anos 90.

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Sombrionauta

Arcano Oliveira (André Moreira Oliveira) Historiador da cultura especializado em cultura pop. Podcaster do O Sombrionauta (um tanto lógico isso).